Fossa ecológica: solução eficiente ao esgoto doméstico rural

Tanque de Evapotranspiração, já adotado no Estado, é um sistema totalmente sustentável que impede contaminação do solo e da água

João Prestes

O esgoto doméstico é um problema ambiental sério no meio rural. Sem rede coletora e sem o saneamento adequado, há o risco iminente de contaminar o solo e o lençol freático, expondo os moradores ao perigo do contágio de diversas doenças de veiculação hídrica, aquelas causadas por patógenos que são adquiridos pelo consumo ou contato com água contaminada. Via de regra, o morador do campo foi ensinado a despejar os resíduos da pia, do banheiro, do tanque e do vaso sanitário, tudo junto, em fossas rudimentares (fossas negras). Trata-se de um buraco aberto no chão, sem revestimento algum, coberto por uma tampa de concreto, muitas vezes numa distância curta do poço ou da fonte de água. Nesse ambiente os dejetos são simplesmente depositados até que a fossa encha e outra tenha que ser aberta para dar continuidade à coleta. 

Outro sistema também utilizado com frequência é a fossa séptica que, diferente da fossa rudimentar, tem o fundo e as paredes revestidos para impedir o contato do material depositado com o solo. Esse tipo de fossa precisa ser esgotada com frequência, já que não infiltra no solo e tende a encher mais rapidamente que a fossa rudimentar. Conforme a Norma Técnica NBR 7229 da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas), a fossa séptica tem que estar a uma distância mínima de 3 metros de árvores e 15 metros de poços para que não haja risco de contaminação. Quanto à fossa rudimentar, a distância segura é o triplo: 45 metros. 

A reportagem da Vida Rural foi até o Núcleo São Joaquim conhecer um sistema ambiental simples, seguro e eficiente que pode trazer solução perene ao problema do esgoto doméstico rural, utilizando os mecanismos que a própria natureza oferece. O TEVAP, sigla para Tanque de Evapotranspiração, teria sido projetado por permacultores, estudiosos que buscam desenvolver um sistema produtivo sustentável. Esse sistema chegou ao Brasil há duas décadas e vem sendo implementado em fase experimental. Em alguns estados há iniciativas para popularização do TEVAP. O recomendado são 2 metros quadrados por habitante, mas considerando que os moradores podem receber visitas, por segurança é melhor construir um tanque um pouco maior.

O Núcleo São Joaquim é a sede de uma entidade religiosa localizado na zona rural de Campo Grande que implantou o TEVAP e serve de modelo para quem tiver interesse na tecnologia. O engenheiro ambiental Miguel Machado Manhães é o responsável técnico, já com experiência no assunto, e fala com segurança sobre a eficiência do sistema. No Núcleo São Joaquim foi feito um tanque de grande porte para atender à demanda, considerando que o local recebe mais de uma centena de associados em algumas ocasiões. Anexo ao TEVAP, outro sistema mais simples recebe os rejeitos da cozinha, dos chuveiros e das pias (águas cinzas).

Engenheiro Miguel Manhães ao lado do TEVAP do Núcleo São Joaquim

O projeto

O TEVAP do Núcleo São Joaquim mede 4m de largura, 10,5m de comprimento por 1,7m de profundidade. Para garantir a impermeabilidade, o tanque foi revestido por uma manta de polietileno (PEBD), material altamente resistente e durável, mas outra alternativa bem mais barata pode ser a parede de cimento e solo, explica Manhães. No centro do tanque foram colocados pneus um ao lado do outro, criando uma grande câmara de digestão anaeróbia. É nesse ambiente que ocorre a decomposição dos dejetos, trabalho feito por bactérias anaeróbias (que sobrevivem sem oxigênio). Essas bactérias se desenvolvem naturalmente e são essenciais para a eficiência do sistema, daí a importância de não misturar os rejeitos sanitários com as águas cinzas (pia, máquina de lavar, chuveiro), porque essas contêm sabão, que mata os microrganismos. 

O encanamento dos banheiros forma uma curva de 90 graus para entrar diretamente na extremidade da câmara de pneus onde os dejetos são despejados. Depois disso vem o trabalho de aterramento do tanque para possibilitar a filtragem do material decomposto que sairá da câmara e que chegará à raiz das plantas dispostas na superfície, completando o ciclo. No fundo do tanque, para proteger a lona, foi depositada uma camada fina de terra. Em seguida uma camada de pedras grandes ou pode ser entulho de material de construção. A camada seguinte já é de pedras menores e assim sucessivamente, até finalizar com uma camada de areia e, por fim, o substrato que vai receber as plantas e que não pode ser um solo muito argiloso para evitar a compactação. 

Importante deixar um suspiro (um cano conectado com a câmara de biodigestão e disposto a uma altura de no mínimo dois metros acima da superfície) para saída do gás resultante do processo. Havendo necessidade de esgotamento do tanque, isso será feito por esse cano. Miguel Manhães lembra também que as bordas do tanque devem ser elevadas para que as águas da chuva não inundem o local. 

 Instalação do círculo de bananeira: filtro para águas cinzas

Feito o aterramento, falta apenas plantar as mudas que vão completar o sistema do Núcleo São Joaquim, o que será feito nos próximos dias. O recomendado são espécies com raízes superficiais e que demandam bastante água para se desenvolver, como bananeira, mamoeiro e taioba. Os frutos podem ser consumidos sem nenhum problema, a planta só vai absorver o que precisa para seu sustento. Já as folhas da taioba, nesse caso, não são apropriadas para consumo. Também não é aconselhável plantar hortaliças ou batatas, por exemplo, sobre o TEVAP. O ideal são plantas frutíferas ou mesmo flores ou quaisquer outras espécies que não desenvolvam enraizamento profundo. 

Anexa ao TEVAP foi construído um círculo de bananeira, que é um sistema mais simples para tratar as águas cinzas, aqueles rejeitos da pia de cozinha, do chuveiro e do tanque. No caso do Núcleo São Joaquim, foi escavado um buraco circular imitando uma bacia, com as bordas inclinadas, sem nenhum revestimento. O cano transportando os dejetos é disposto no fundo, perfurado nas laterais para a água infiltrar. Esse pedaço do cano é coberto por brita para evitar que entupa. Em seguida, todo o buraco é aterrado por folhas secas de árvores e nas bordas se plantam as bananeiras. O círculo de bananeiras também recebe um extravasador do TEVAP, uma espécie de “ladrão” para evitar que o tanque acumule muito líquido. Isso também vai garantir a durabilidade do sistema, explica Manhães. 

Onde buscar ajuda?

O morador que tiver interesse em implantar o TEVAP em sua propriedade deve buscar orientação técnica com um engenheiro ambiental ou algum outro profissional da área para ajuda-lo a dimensionar adequadamente e executar a obra dentro dos padrões, garantindo eficiência e durabilidade. Há uma cartilha mostrando o passo-a-passo do projeto disponível para download no site do Consórcio Intermunicipal do Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba (CIDES). Procure no Google por cartilha tanque de evapotranspiração – CIDES.

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